Muito justo para o futuro?

Por 150 anos, o terno foi o traje do homem de negócios que se preza. Mas, e na era dos ambientes de trabalho criativos e do home office, há futuro para o bom e velho costume?

Este foi o ponto de partida para a matéria que escrevi para a Época Negócios deste mês (março de 2011), a convite do diretor da revista, Nelson Blecher. Confira a seguir!

Símbolo de poder, força, sobriedade, elegância e virilidade, o terno é capaz de inspirar confiança e definir o lugar em que o homem se encaixa na sociedade. Padres, médicos, juízes e outras autoridades têm usado vestimentas escuras e camisas brancas para inspirar lisura e impor respeito há pelo menos 150 anos. Durante muito tempo, pouca coisa mudou na estrutura da roupa de trabalho masculina, composta por paletó, colete e calça, feitos do mesmo tecido. Aliás, é bom lembrar que a palavra “terno” refere-se a este trio; quando não há colete, a palavra correta é costume. Desde a revolução industrial, nos séculos 18 e 19, até os anos 80, no apogeu da cultura yuppie, era impensável que empresários importantes recebessem clientes em mangas de camisa.

Não há dúvida de que a mudança da cultura corporativa que vem acontecendo nas últimas três décadas – que tem como tônica valorizar a inovação e a informalidade em oposição à tradição e ao formalismo – abriu espaço para um novo código de vestuário. A uniformidade dos ternos sóbrios tem perdido espaço para visuais mais lúdicos e criativos. Em certa medida, pode-se dizer que essa possibilidade de personalização por meio do vestuário sinaliza o triunfo do indivíduo sobre a corporação. Isso vai ao encontro das vivências da Geração Y, que… (Quer continuar lendo? Compre a revista na banca mais próxima ou acesse o site da revista ).

CONTEÚDO EXTRA – EXCLUSIVO

Leia, abaixo, a entrevista com Paolo Ferrarini, consultor sênior que trabalha com estéticas emergentes e comportamentos digitais, e conduz projetos de pesquisas em áreas como moda, tecnologia, comunicação e varejo, no Future Concept Lab, em Milão, na Itália.

Como a chegada das novas gerações ao poder irá influenciar o traje corporativo? Haverá espaço para mudanças radicais nos próximos 10 ou 15 anos? A formalidade será abrandada, ou mesmo substituída por outros valores?

Paolo Ferrarini: Não haverão mudanças radicais, mas sim um trabalho cada vez mais intenso nos detalhes de confecção e suas particularidades de estilos. Um bom exemplo, que já podemos ver hoje, está no estilo presente em revistas cult para os globetrotters, como a Monocle. Não estamos diante de códigos uniformes e internacionais, mas altamente pessoais, que tendem a uma roupa única, personalizada!

Pode-se dizer que alguns itens, como a gravata e a camisa social, estão com os dias contados?

PF: Absolutamente não. Estas serão as maiores áreas de experimentação e busca de personalização.

A ascensão das mulheres aos altos cargos corporativos levou-as a copiar o traje masculino, adotando ternos e tailleurs como vestimenta no trabalho. Existirá espaço, no futuro, para uma feminização dos trajes? Ou a feminilidade ainda tende a ser vista como antagônica ao profissionalismo?

PF: A fusão dos gêneros ainda não aconteceu totalmente e não acontecerá no futuro próximo: o cuidado e a atenção que dispensamos ao nosso corpo é semelhante para o homem e a mulher, mas está levando a acentuar as nossas singularidades. O mesmo acontecerá nas roupas de trabalho: as diferenças de gênero serão elementos de distinção e irão sublinhar os respectivos pontos de força. Estamos agora muito distantes da working girl dos anos 80, que procurava imitar o homem para reinvidicar o seu papel social. Mas ainda estamos distantes do metrosexual, de um homem que quer a todo custo mostrar-se doce e sensível.

originais do ritmo

 Se a Casa de Criadores fosse uma escola de samba, esta ala seria a vencedora do quesito Originalidade.

 A P’tit é uma marca que eu poderia definir recriando um velho sucesso do Renato Russo: “roupa estranha para gente esquisita”.  Isso não é uma crítica negativa, não me entenda mal. É que as modelagens são sempre cheias de “loucurinhas”, recortes estranhos e adereços enigmáticos. Além disso, não parece haver a preocupação de se fazer uma coleção completa, coerente. O que há são peças soltas que orbitam um mesmo universo. Bem, mas se falta coesão, sobra personalidade.

A Ash, conhecida pelas belas estampas grafitadas com apelo streetwear, elegeu como tema desta coleção os animais marinhos ameaçados pela ação do homem. Baleias e águas-vivas aparecem em versões maximizadas e, às vêzes, sob tecidos transparentes.

A grande revelação do Projeto Lab foi a Der Metropol que apresentou uma moda esportiva com vocação street, e ótimas misturas de padronagens, cores e tecidos.  “As camisetas com figuras de animais já nascem hit”, como costumam dizer no site da Erika Palomino.

João Pimenta é um dos darlings da Casa de Criadores e seus desfiles costumam ser, o mínimo, antológicos. Nesta edição, o estilista optou por fazer uma apresentação mais contida, com foco na roupa. Confesso que fiquei um pouco desapontada. O estilista fez, sem dúvida, um belo exercício de estilo usando os uniformes de baseball como mote, mas a gama de cores escuras e as malhas encorpadas resultaram invernais demais. O toque de irreverência ficou por conta dos cabelos.

Gustavo Silvestre, estilista de origem pernambucana, fez bonito com as estampas de carroceria de caminhão, tanto em looks de tecidos naturais –feitos para o dia–, quanto em versões glamourosas, com bordados elaborados.

[todas as fotos são de CHARLES NASEH/CHIC]

cineminha dos criadores 3

E o desfile de João Pimenta, no segundo dia da Casa de Criadores? Foi sensacional!

Com inspiração primitivista, a coleção faz o escambo cultural entre a tribo norte-americana Navajo e a Maori da Nova Zelândia. Usa cores sóbrias –marrom, azul,  e preto– para simbilozar o decadentismo, o dia e a noite, a morte. As silhuetas são extremas: muito ajustadas ou amplas, roqueiras ou orientais.

O melhor de tudo é que João Pimenta consegue fazer essa salada multiétnica sem perder de vista o homem contemporâneo. É de tirar o folêgo, e o chapéu!

Fotos: Charles Naseh/Chic