Hoje, a Folha de Sâo Paulo publicou uma matéria, no caderno Cotidiano, sobre pessoas que estão se passando por “olheiros” de agências de modelo, com a intenção de conseguir fotos sensuais de meninas aspirantes a esta profissão.
Esse tipo de golpe não é novo e nem incomum, só que, agora, ele acontece através da internet, incluindo ferramentas como emails falsos, conversas por MSN, e sugestão de nudez através de webcam. Alguns golpistas chegam a convidar as garotas para virem para São Paulo, como atesta a mãe de uma delas, que tinha concordado com a viagem, em nome do tal “sonho de ser modelo” da filha.
É claro que é preciso alertar as pessoas para que tomem muito cuidado com abordagens de caça-talentos, para que chequem a idoneidade das pessoas e das agências envolvidas. Mas não é só isso, é necessário atentar para esta outra questão: ser modelo virou a tábua de salvação, o sonho de consumo de um número enorme de adolescentes. E até de crianças.
Hoje, por coincidência, uma outra matéria jornalística falou sobre a fixação feminina em padrões de beleza e comportamento: o Profissão Repórter de Caco Barcelos, na Globo. O programa acompanhou 3 concursos:
Garota da Laje, que aconteceu em pleno Saara carioca (para quem não conhece, Saara é um bairro de comércio popular, tipo 25 de Março) e tinha como único pré-requisito… gostar de tomar sol na laje.
Mini Miss Brasil, em Santa Catarina, em que crianças a partir de 5 anos de idade competem como gente grande, com maquiagem, poses e sorrisos ensaiados (quem já viu o filme Pequena Miss Sunshine, já sabe a doideira que é) para serem coroadas por sua beleza
Concurso de Prendas, no Rio Grande do Sul, que escolhe a moça mais prendada em termos de tradições gaúchas. E neste caso, ora vejam, ela nem precisa ser bonita, mas tem que saber bordar, cantar e dançar músicas típicas. Uma donzela em pleno século 21.
O contraste entre os 3 concursos foi muito interessante e, sem dúvida, a grande sacada da matéria. Enquanto as popozudas cariocas exibiam seus atributos sem pudor, as mães se realizavam através do sucesso das filhinhas, e a caravana de moçoilas vestidas com trajes típicos, treinava danças anacrônicas.
Os momentos mais marcantes (ou seriam aterrorizantes?), para mim, foram: a menina de 5 anos, quando questionada pela repórter se admirava de algum adulto, responde: a Gisele! Quem? A Gisele Bundchen! Sim, sem nem gaguejar no sobrenome! A cena em que uma outra garota, de 12 anos, chora depois de ter sido ameaçada com uma surra pela mãe de uma concorrente, por ter esbarrado nela. A popozuda indignada que vocifera para a câmera sua indignação por não ter ganho o prêmio: um automóvel usado, ano 2001. E ela ainda desdenha da ganhadora dizendo que tem carro zero!
No concurso de prendas, parece haver mais civilidade, escorrem lágrimas de decepção, mas de forma contida. Afinal, não fica bem para uma dama dos pampas sair dando escândalo em público. Uma das prendas desclassificadas, com silhueta mais roliça que as demais, se alegra pelo sucesso das amigas selecionadas como finalistas. Neste grupo, não há lugar para a rebeldia ou a inveja explícita.
Os fatos falam por si. A competição insana, a beleza como meio de ascenção social, e até a infalível coroação mostram que a fábula da Cinderela, da Gata Borralheira, continua viva no imaginário, nos livros, na televisão, e agora, é claro, nas páginas da web.
Acho até que vale a pena rever o filme da Dove que mostra a manipulação de imagem de uma modelo, aqui.